11.5.06

Nasceu-me um trevo num vaso

Nasceu-me um trevo num vaso. Quis beijá-lo. Queixosa, a flor reteve o meu ímpeto com uma fragilidade verde.

Nasceu-me um trevo num vaso e não sei que fazer deles. Do vaso tanto como do botão mínimo dessa vida recém-desperta.

Nasceu-me um trevo, num vaso de cor de barro sujo. Da cor da relva regada, aquela nova vida acompanha-me agora os passos pela casa. Não me sinto só. Pelo contrário. Acontecem-me agora despertares diferentes. Neste e nos outros dias que hão-de vir.

Nasceu-me um trevo num vaso e desse monopólio de olhares antevejo entre ambos uma feliz cumplicidade. Mas o vaso não é teu, menino trevo. É dessa palmeirinha merdosa que aconteceu, transplantada, antes de ti. A terra onde repousas o teu caule esguio foi alugada a esse corpo de furúnculos domésticos que se debate contra o mais mínimo sol para não perecer fuzilado por raios violetas e ultras.

Nasceu-me um trevo num vaso. Quem te mandou, trevo, decidir acontecer precisamente agora? E se me abandonas, que farei do trevo que já não serás? De que trevo falarei?

Nasceu-me um trevo num vaso. Não me morras agora, verde flor, filha da terra livre e do acaso. Dá-me, antes de mais, um beijo teu. Frágil ou não. Dá-mo, que não me importo.

Moscavide, 11/Setembro/98